MARANHÃO: SECRETARIOS DE MEIO AMBIENTE E DE SEGURANÇA PÚBLICA NA GESTÃO DOS GOVERNADORES FLÁVIO DINO E CARLOS BRANDÃO

Arleth Santos Borges / Antonio Marcos Pereira / Marcelo Fontenelle e Silva / Soraia França Weba

Em sistemas presidencialistas e multipartidários a composição de governos, tanto no nível federal como nas unidades subnacionais envolve cuidadosa engenharia política para combinar amplo número de variáveis, entre as quais se destacam: partidos da coalizão eleitoral; partidos da coalizão governamental; critérios técnicos; critérios pessoais; critérios de ordem federalista/municipalista e até reposicionamentos de aliados que ficaram na suplência de cargos legislativos estaduais ou federais e que podem assumir o mandato mediante nomeação de eleitos para outros cargos[1] .

Flávio Dino (PCdoB) venceu as eleições de 2014 com uma coligação partidária que envolvia nove partidos, majoritariamente de direita (PP, SD, PROS, PSDB, PCdoB, PSB, PDT, PTC e PPS). Sua base de apoio no Legislativo acrescenta a estes aliados desde o momento eleitoral outros 13 partidos (PHS, PSL, PT, PMN, PTdoB, PSDC, PRTB, PTN, DEM, PSC, PRB, Pr e PEN). Na reeleição, em 2018, sua composição eleitoral foi mais ampla, contando com 16 partidos (PCdoB, PRB, PDT, PPSDEM, PSB, PR, PP, PROS, PT, PTB, PATRIOTA, PTC, SD, PPL E AVANTE) e no apoio ao governo, somaram-se a estes o PRTB, PSL e PMN. Tanto em 2014 quanto em 2018, as coligações foram bastante amplas, em número e em ideologias, o que prenunciava muitas e conflitantes demandas ao chefe do Executivo e muita engenharia institucional para conciliar o atendimento aos aliados com a preservação do governante e do programa vitoriosos nas urnas, afinal, como a literatura especializada tem demonstrado: partidos contam! Sobretudo na esfera governamental.

Carlos Brandão (PSDB/PSB) concorreu às eleições no exercício do cargo de governador, pois sendo vice nos dois mandatos de Flávio Dino (de 2015 a março de 2022) assumiu a titularidade do governo em abril de 2022, quando Dino deixou o cargo para disputar uma vaga no Senado. A coalizão eleitoral que o elegeu teve dez partidos: PSB, MDB, PP, PATRIOTA, PODEMOS, Federação Brasil da Esperança (PT/PCdo B/PV) e Federação PSDB e CIDADANIA.

Em relação à composição do Secretariado, Dino contemplou a abrangência e heterogeneidade de suas bases de apoio eleitorais e governamentais, ao tempo em que buscou quadros em círculos universitários e de notório saber, assim como quadros de seu próprio partido, algumas vezes recrutados em outros estados. Brandão, quando substituiu Dino, procedeu algumas alterações no Secretariado do Governo estadual, mas as mudanças de maior monta ocorreram após a sua própria eleição; na composição da coalizão de apoio ao governo no Legislativo, outros partidos se integraram e ganharam cargos no secretariado – caso do PL, que elegeu cinco deputados/as e, mediante aliança com o governador, foi agraciado com uma secretaria; em outra ponta, o União Brasil, também de oposição à candidatura de Brandão, elegeu um parlamentar, que hoje é o líder do governo na Assembleia Legislativa.

Em ambos os casos, de Dino e Brandão, é possível afirmar que na composição da equipe de governo prevaleceram critérios político-partidários, embora algumas situações realcem atributos técnicos dos indicados, sua formação acadêmica, expertise e experiência na área de atuação.

Dada a centralidade dos conflitos socioambientais na Amazônia maranhense e na agenda do LEGAL (Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal), o presente Boletim examina o perfil dos Secretários de Estado do Meio Ambiente e Recursos Naturais e de Segurança Pública escolhidos pelos citados governadores, entre 2015 e 2024. O objetivo é reunir elementos descritivos e analíticos que contribuam para: compreensão sobre as dinâmicas dos conflitos ambientais no estado; conhecimento do perfil dos gestores de políticas relacionadas a esses conflitos; identificação das interações entre degradação ambiental e violência, assim como as formas de enfrentamento por parte do governo estadual.

Ressalte-se que, embora a nomeação de Secretários e a orientação das políticas públicas sejam atribuições constitucionais do governador, existem dispositivos internos e externos ao governo – incluindo movimentos políticos, interesses particulares ou de grupo em relação à pasta, maior ou menor lealdade ao governo -, que conferem a esses agentes relativa autonomia na tomada de decisões a despeito do poder de veto do chefe do Executivo estadual, o que complexifica os processos de seleção desses agentes.

A SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA NO MARANHÃO

A Constituição Estadual maranhense, promulgada em 1989[2], traz em seu Artigo 112 que “a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida com vistas à preservação da ordem pública e incolumidade das pessoas e do patrimônio pelos seguintes órgãos: I – Polícia Militar; II – Polícia Civil; III – Corpo de Bombeiros Militar” (CE, 1989, p. 67). Também consta, no artigo 113, que “Ao órgão central do Sistema de Segurança Pública cabe a organização e coordenação dos órgãos responsáveis pela segurança pública, para garantir a eficiência deles”. No sítio institucional da SSP, acrescenta-se ainda outros dois órgãos (o DETRAN e a Defesa Civil), além de reiterar o lugar da SSP como órgão central do Sistema de Segurança Pública no âmbito do estado.

Nessa caracterização das funções e objetivos do “Órgão Central do Sistema de Segurança Pública”, os propósitos de garantir “a ordem pública” (artigo 112) e “a “segurança pública” (artigo 113), remetem a uma ambiguidade com objetivos e funções das forças armadas, ocorrendo, inclusive, que a Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 144, §6º afirme que “as polícias militares e os corpos de bombeiros militares, são forças auxiliares e reserva do Exército” ainda que subordinadas, juntamente com as polícias civis e as polícias penais estaduais e distrital, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios”. Como corolário dessa visão, que militariza a ordem e segurança pública e reserva às forças armadas protagonismo no cotidiano dos estados e até na política, o Artigo 142 da Constituição Federal afirma que as forças armadas “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Diversos estudiosos[3] enxergam nessa ambiguidade incentivos a uma intervenção mais violenta e menos cidadã pelos órgãos estaduais de segurança pública.

Secretários de Segurança Pública nomeados por Flávio Dino e Carlos Brandão

Inexistem exigências de que o/a secretário de segurança seja policial, o cargo é de livre nomeação do governador. Entretanto, a praxe no Maranhão é que os titulares dessa pasta sejam recrutados nos quadros das polícias civil, militar ou federal. Desde a redemocratização, apenas uma exceção confirma essa regra: a nomeação de Eurídice Vidigal, no breve governo de Jackson Lago, do PDT (2007- abril de 2009). Eurídice era esposa de Edson Vidigal, político tradicional maranhense, que também fora ministro do STJ.

A prevalência de policiais sinaliza que, mesmo prevalecendo critérios políticos partidários nas composições de equipes de governo, com vistas à formação de maiorias legislativas, a depender do cargo, outros critérios são privilegiados. Com efeito, o cargo de secretário/a de segurança mobiliza critérios técnicos, experiência, boas relações com as cúpulas das polícias estaduais e, mesmo “ter pulso forte”, jargão policial que alude à autoridade e uso da força. Ao longo dos dois mandatos de Flávio Dino (PCdoB) e do mandato de Brandão (PSB), iniciado em abril de 2022, o Maranhão teve quatro Secretários de Segurança Pública[4]. São eles:

  1. Jefferson Miler Portela – nomeado por Flávio Dino, foi Secretário foi Secretário Estadual de Segurança no período de 2015 a 02/2022. É Delegado da polícia civil, graduado em Direito (UFMA) e Especialista em Direito Penal (Estácio). Contemporâneo de Dino no curso de Direito e na militância estudantil, tem registros de filiação partidárias e candidaturas a cargos eletivos: deputado estadual (PAN, 2006), vereador de São Luís (PCdoB, 2012) e deputado federal (PDT, 2022).
  2. Leonardo do Nascimento Diniz – nomeado por Flávio Dino, exerceu o cargo no período de 07/02/2022 a 05/04/2022. É delegado da Polícia Civil, graduado em direto (UFMA), ocupou o cargo de Secretário adjunto de Segurança Pública (de 2020 a fevereiro de 2022), foi Delegado geral do Estado (de 08/2017 a 14/09/2020) e Superintendente de Homicídios e de Proteção à pessoa – SHPP.
  3. Silvio Leite – nomeado por Carlos Brandão, exerceu o cargo no período de 06/04/2022 a 03/04/2023. É coronel da Polícia Militar, doutorando em Políticas Públicas (UFMA), mestre em Direito Constitucional (Universidade de Fortaleza – UNIFOR), graduação em Direito na Universidade (UNICEUMA) e Curso de Formação Segurança Pública na Universidade Estadual do Maranhão – UEMA. Também possui cursos de especialização em gestão de transporte e em outras áreas do Direito. Foi chefe do Gabinete militar no governo de Flávio Dino.
  4. Maurício Ribeiro Martins, – nomeado por Carlos Brandão, está no cargo de 04/04/2023 até os dias atuais. É delegado da Polícia Civil. Já foi subsecretário de Segurança Pública e corregedor adjunto de Polícia Civil, diretor da Academia de Polícia Civil e titular de delegacias em vários municípios maranhenses. É cunhado do delegado da polícia federal Raimundo Cutrim, ex-secretário estadual de segurança pública (1997 a 2006-2009 a 2010) e ex-deputado estadual (2007-2019 pelo PFL/DEM e PCdoB).

Neste pequeno conjunto de casos, constata-se como elemento comum a formação universitária em Direito (Lei nº 12.830/2013) e a condição de policial, com predominância da polícia civil. A experiência prévia é acentuada em dois casos e escassa em outros dois. Mais escassa ainda é o investimento em formação e títulos acadêmicos. Influências político partidárias estão presentes, mas de modo discreto. Em brevíssimo registro sobre políticas implementadas por esta Secretaria no período em foco, destaca-se a reiterada afirmação pelos titulares da pasta de dados do Ministério da Justiça” que apontam uma “tendência de queda nos índices de violência no estado, incluindo os presídios, resultantes de ampliação do contingente policial, servidores e viaturas, além da reestruturação das instalações de segurança pública.

Por outro lado, e sem rejeitar os indicadores mais positivos para as cidades de maior porte, esse discurso, é questionado por estudiosos que associam essa queda a reposicionamentos de facções do crime organizado e, com outra perspectiva, organizações da sociedade civil, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), na mesma linha do estudo “Cartografias da Violência na Amazônia”, do Forum Brasileiro de Segurança Pública[5], aponta um aumento dos conflitos e violência nas zonas rurais, territórios especialmente vulneráveis aos conflitos socioambientais.

SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS NATURAIS

A Constituição do Maranhão, em seu Art. 12, inciso I, alínea f, destaca como competência do Estado “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”. E, concorrentemente com a União, lhe cabe legislar sobre “floresta, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico, e responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, e a bens” (inciso II, alíneas f-h). Também prescreve a proteção ambiental no meio urbano, políticas de desenvolvimento agrícola compatível com a preservação ambiental e conservação do solo, proteção de áreas ecologicamente relevantes e de populações que realizam atividade econômica tradicional como quebradeiras de coco e pescadores.

O Capítulo IX (arts. 239-250) é todo dedicado ao meio ambiente e, entre muitos aspectos relevantes, afirma que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente saudável e equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade da vida, impondo-se a todos, e, em especial, ao Estado e aos Municípios, o dever de zelar por sua preservação e recuperação em benefício das gerações atuais e futuras (Art. 239) e que “a atividade econômica e social conciliar-se-á com a proteção ao meio ambiente. A utilização dos recursos naturais será feita de forma racional para preservar as espécies nos seus caracteres biológicos, na sua ecologia, harmonia e funcionalidade dos ecossistemas, para evitar danos à saúde, à segurança e ao bem-estar das populações (Art. 240).

Para dar conta desses desafios, o governo do estado conta com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Naturais (SEMA), responsável por

planejar e coordenar a execução das políticas relativas à promoção, organização, normatização, fiscalização e controle das ações relativas à exploração e preservação do meio ambiente e dos recursos naturais.

A SEMA conta com três Secretarias Adjuntas (Desenvolvimento Sustentável, Licenciamento, Recursos Ambientais) e nove Superintendências (Recursos Hídricos, Licenças Ambientais, Biodiversidade e Áreas Protegidas, Recursos Florestais, Gestão de Resíduos, Economia Verde, Educação Ambiental, Fiscalização, Planejamento e Monitoramento), sendo que estas contam com supervisões[6].

Além desse amplo escopo e diversidade de funções, a SEMA, através de seu titular, preside três órgãos externos ligados diretamente à Secretaria: CECA – Câmara Estadual de Compensação Ambiental; CONERH – Conselho Estadual de Recursos Hídricos; e CONSEMA – Conselho Estadual de Meio Ambiente do Maranhão. Essas instituições colegiadas exercem atribuições consultivas, normativas, deliberativas e recursais em temáticas ambientais influenciadas pelo poder de veto do titular da pasta ambiental, que também exerce a presidência da CECA e dos dois Conselhos. No exercício de suas funções políticas administrativas, a CECA e os Conselhos têm representação do Poder Público, empresariado, sociedade civil e entidades ambientalistas não governamentais. Entre os membros desses conselhos ressalta-se a presença de representantes titulares da Secretaria Estadual de Segurança Pública, da Associação dos produtores de soja e milho do Maranhão – APROSOJA, da Federação da Agricultura e Pecuária do estado do Maranhão – FAEMA e da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco- CODEVASF.

Ao longo do governo de Flávio Dino e Carlos Brandão foram nomeados seis secretários para a pasta de Meio Ambiente e Recursos Naturais. São eles:

  1. Marcelo Coelho – nomeado por Flávio Dino em seu primeiro mandato, exerceu o cargo no período de 2015 a 2019. É graduado em Direito e Comunicação Social e foi Secretário Municipal de Agricultura, Pesca e Abastecimento de São Luís, no governo do prefeito Edivaldo Holanda (PSC/PDT), cujo vice era Roberto Rocha (PSB), que em 2014 elegeu-se senador e ao governador para o cargo na SEMA. recomendou. Foi chefe da Secretaria de Comunicação e Eventos do município de Codó-MA e destaca ter experiência em gestão empresarial nas áreas de empreendedorismo e cooperativismo; foi coordenador executivo do Terminal rodoviário de Teresina-PI e assessor parlamentar na Assembleia Legislativa de Pernambuco. Atuou para manter o PSB na base de apoio a Dino mesmo depois da ruptura entre este e Roberto Rocha.
  2. Rafael Carvalho Ribeiro – nomeado por Flávio Dino em seu segundo mandato, permaneceu no cargo entre 2019 e 2020. É engenheiro ambiental, tem mestrado em Administração Pública e especializações em Gestão Estratégica de Tecnologia da Informação e Engenharia Sanitária e Ambiental. Foi superintendente do Patrimônio da União no Maranhão. É do PP, filho do prefeito de Alto Alegre do Pindaré e irmão do deputado federal e atual ministro dos Esportes, André Fufuca (PP).
  3. Diego Rolim – nomeado por Flávio Dino, ocupou o cargo entre 2020 e 2021. É advogado, foi chefe da Assessoria Jurídica e Procurador-Geral do Município de Alto Alegre do Pindaré e cunhado do deputado federal André Fufuca (PP).
  4. Diego Galdino – nomeado por Flávio Dino, permaneceu no cargo entre 2021 e 2022. Graduado em Administração de empresa e em Direito; atuou como analista de recursos humanos sênior na Vale até 2015, quando passou a compor o governo de Flávio Dino, no cargo de Secretário Estadual de Cultura (2015-2016); depois, Secretário de Cultura e Turismo (2016-2019), de Governo (2019-2021) e Chefe da Casa Civil (2021-2022). Já no governo de Carlos Brandão, foi Secretário de Governo (2022-2023) e Chefe da Casa Civil. Sua rápida e interina atuação na SEMA ocorreu quando, no comando da Casa Civil do governo Brandão, houve vacância do cargo de secretário da SEMA e a pasta ficou sob a gestão da Casa Civil até a indicação de novo titular.
  5. Raysa Queiroz Maciel – nomeada por Carlos Brandão, esteve no cargo entre 2022 e 2023. Advogada e pedagoga, tem pós-graduação em Direito Tributário. Foi Secretária Executiva e Coordenadora de Projetos da Secretaria Extraordinária de Pesca e Aquicultura, no governo de Roseana Sarney, e assessora especial do então vice-governador, Carlos Brandão. Entre 2017 e 2019, foi secretária parlamentar no gabinete do deputado federal Cleber Verde (à época no PRB). Desde 2022, por indicação do governador Carlos Brandão, preside o Instituto de Previdência dos Servidores do Estado do Maranhão. À frente da SEMA, foi eleita Vice-Presidente do Fórum de Secretários de Meio Ambiente da Amazônia Legal.
  6. Pedro Chagas – nomeado por Carlos Brandão, está no cargo de 2023 até os dias atuais. Advogado, com pós-graduação em Perícia, Auditoria e Gestão Ambiental; tem publicações acadêmica na área de Direito Eleitoral e na área ambiental. Foi Secretário de Estado da Gestão, Patrimônio e Assistência dos Servidores – SEGEP e, à frente da SEMA, foi o segundo secretário da pasta ambiental do Maranhão a ocupar a Vice-Presidência do Fórum de Secretários de Meio Ambiente da Amazônia Legal. Foi presidente estadual do PSDB.

Nestes seis casos, constata-se que todos os/a secretários têm formação universitária, com predomínio da área de Direito (cinco casos). Também é comum a todos a experiência profissional no setor público, embora em áreas muitas vezes distintas da ambiental. É muito presente o elemento político partidário nas indicações e vinculações dos titulares da pasta, destacando-se a influência de André Fufuca, do PP.

CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS E (IN)SEGURANÇA

O Maranhão tem sido palco de muitos conflitos socioambientais, associados à apropriação violenta de terras, desmatamentos, avanços das monoculturas agrícolas, sobretudo soja, com uso intensivo de defensivos químicos (agrotóxicos) e método de pulverização aérea; ampliação da atividade mineradora, instalações portuárias de grande porte, exploração de fontes energéticas como termoelétricas e gás natural, e outras modalidades de exploração econômica que fazem do Maranhão um estado líder nos rankings de conflitos ambientais. Recente levantamento do Programa Estadual de Proteção de Defensores/as de Direitos Humanos no Maranhão registra 132 pessoas ameaçadas de morteviii.

Não por acaso, em 2023 foi criada a Comissão Nacional de Enfrentamento à Violência no Campo (CNEVC)[7], que iniciou seus trabalhos de campo com “escutas em 51 comunidades tradicionais e quilombolas do Maranhão”, as quais, segundo seu Relatório, vivem sob ameaças constantes de fazendeiros, grileiros e milicianos”. Nessas escutas foi relatada “a negligência do Estado em relação à violência, seja do Incra, do Ibama ou da Sema. Inclusive, houve fortes relatos de que a Sema concede licenças ambientais temporárias, de modo ilegal, com autorização para os fazendeiros desmatarem o território das comunidades”[8]

O mesmo Relatório menciona extensa lista de violências sofridas por essas comunidades e a negligente intervenção dos órgãos do Governo do Estado. Destaca:

licenças ambientais de modo ilegal (governo do Estado); desmatamento em áreas das comunidades com licença da Sema (crime ambiental); extração ilegal de madeiras, com denúncias que já ocasionaram prisão em flagrante e ameaças a lideranças da comunidade; invasão de grileiros com tratores derrubando casas, cercas, roças das comunidades; ameaças e intimidação com tiros, matando animais da comunidade e pressionando a comunidade a deixar o território;  uso de agrotóxicos sobre as plantações das comunidades;  impunidade em relação aos assassinatos e violências contra as comunidades e presença de policiais (milícias) na escolta dos agressores durante os atos violentosviii.

Na contramão dessas preocupações, uma das principais marcas da presente atuação da SEMA parece ser o aligeiramento e simplificação do licenciamento ambiental, destacando-se a recente criação do Programa “Simplifica Maranhão”, inspirado na gestão ambiental do Instituto de Meio Ambiente do Mato Grosso do Sul – IMASUL, cujo modelo de controle, gestão e fiscalização ambiental é recepcionado pelo titular da SEMA como “exemplos de governança ambiental” porque “simplifica e desburocratiza o licenciamento ambiental” (IMASUL, 2023). Ou seja, o Simplifica Maranhão foi institucionalizado como forma de desburocratizar o licenciamento ambiental, justificado como uma necessidade para acelerar o desenvolvimento das atividades do setor produtivo do estado como o Programa Minha Casa Minha Vida, empreendimentos agropecuários e industriais (Governo do Maranhão, SEMA, 2023).

Conclusões

Os perfis de secretários aqui retratados oferecem subsídios para a análise da questão ambiental e da segurança pública no governo do Maranhão nas gestões de Flavio Dino (PCdoB) e de Carlos Brandão (PSB), que datam de 2015 aos dias atuais. Abordou-se a complexidade de estruturar uma equipe de governo, devido às muitas, e às vezes conflitantes, variáveis a serem coordenadas. Embora não se tenha feito um exame exaustivo dos critérios de recrutamento e seleção de secretários e de suas respectivas trajetórias, a exigência de construção de maioria legislativa sugere uma principalidade das alianças político-partidárias. No caso das duas secretarias e secretários avaliados, esse critério se mostrou válido sobretudo para a SEMA, embora também sejam nítidos os investimentos de alguns titulares na qualificação técnica na área. Na Secretaria de Segurança, também se destacou a formação técnica, mas sobretudo a experiência dos gestores e capacidade de comando dos efetivos de segurança, o que envolve o reconhecimento do gestor pelos próprios militares. O maior número de secretários/as na SEMA comparativamente à SSP sugere certa blindagem da área de segurança, enquanto o meio ambiente é mais frequentemente tomado como disponível para o jogo e trocas político partidárias.

Juntando as duas pontas: meio ambiente e segurança, destacam-se os conflitos socioambientais e a violência que os cercam, em clara manifestação de que andam juntos e se retroalimentam, desafiando os gestores públicos no sentido de soluções efetivamente novas e ancoradas nas garantias constitucionais estabelecidas para ambas as áreas.

Agradecimentos

Iniciativa Amazônia+10

Placa branca com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente com confiança média
  1. Ilustrando com um caso da política maranhense: para viabilizar a posse do suplente de deputado estadual, Zé Inácio (PT), o governador Carlos Brandão estabeleceu a Secretaria de Assuntos Legislativos do Governo do Maranhão e designou como titular da pasta a deputada Ana do Gás (PCdoB), oportunizando a posse do suplente e a presença do PT na Assembleia Legislativa. Os dados sobre candidaturas e coligações partidárias foram extraídas do site do TSE (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/) e aquelas sobre coalizões governamentais, extraídas de Diários da ALEMA, no dias referentes à primeira seção do mês de junho (2015, 2019 e 2023), ver https://www.al.ma.leg.br/diarios/diarios_busca.php

  2. Disponível em https://www.al.ma.leg.br/arquivos/constituicaoma.pdf

  3. Ver: Miguel, L. F. (2022). Democracia na periferia capitalista: impasses do Brasil. Belo Horizonte: Autêntica. ZAVERUCHA, J. Relações civil-militares: o legado autoritário da Constituição brasileira de 1988 in TELES, E.; SAFATLE, W. (Orgs.) O que resta da ditadura. São Paulo: Boitempo, 2010

  4. As informações sobre os secretários são as disponíveis nas fontes consultadas – notas do governo, imprensa, canais de assembleia, TSE e canais de redes sociais, que não trazem os mesmos conteúdos sobre todos os agentes mencionados.

  5. Ver: https://www.ma.gov.br/noticias/maranhao-tem-queda-no-numero-de-mortes-violentas-no-segundo-trimestre-de-2023; CPT Dados parciais da violência

  6. MARANHÃO /SEMA. https://www.sema.ma.gov.br/sobre-sema Acesso em 13/03/2024

  7. BRASIL / PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Decreto nº 11.638, de 16 de agosto de 2023

  8. Todas as informações e citações referentes a essas escutas foram extraídas de Relato da visita da CNEVC ao Maranhão no período de 19-23/02/2024 feito pela CPT e disponível em: https://www.cptnacional.org.br/publicacoes-2/noticias-2/6693-campanha-contra-a-violencia-no-campo-acompanha-missao-da-comissao-nacional-de-enfrentamento-a-violencia-no-campo-no-maranhao?highlight=WyJtYXJhbmhcdTAwZTNvIl0= Acesso em 13/04/2024.