João Paulo S. L. Viana; Patrícia M. C. de Vasconcellos; Melissa V. Curi; Gabriel X. R. Souza
O presente boletim tem como objetivo ampliar o entendimento sobre as políticas ambientais no estado de Rondônia, a partir de uma análise do perfil dos secretários estaduais de meio ambiente e de segurança pública do estado, de 2019 até os dias atuais. Apesar do recorte temporal, pretende-se considerar nessa análise o histórico das políticas de ocupação do estado de Rondônia, visto que o pensamento predominante da época determinou a forma de se relacionar com o meio ambiente e estruturou as políticas estaduais de desenvolvimento que, via de regra, não valorizam a floresta em pé.
Em Rondônia, o atual governador é o Coronel da PM Marcos Rocha, filiado ao partido União Brasil. Foi eleito Governador do Estado de Rondônia para o mandato de 2019/2022, e reeleito, em segundo turno, com 52,47%, para o período de 2023/2026.
Conhecer o perfil dos secretários estaduais de meio ambiente e segurança pública em Rondônia, certamente, contribuirá para um melhor entendimento das dinâmicas políticas e institucionais relacionadas à preservação ambiental e à segurança dos recursos naturais no estado, e, também, para o aprimoramento contínuo das políticas públicas de promoção do desenvolvimento sustentável.
Antes de entramos nos referidos perfis, vale apresentar um breve histórico da ocupação do estado de Rondônia e dos seus reflexos socioambientais.
O estado de Rondônia está localizado na porção ocidental da Amazônia brasileira e o seu território ocupa cerca de 238.000 km2. Originalmente, tinha cerca de 208.000 km2 ocupados por florestas tropicais densas. Os primeiros assentamentos de populações vindas de outras partes do país ocorreram durante dois ciclos da borracha – o primeiro no século 19 e o segundo durante a Segunda Guerra Mundial. Embora sejam considerados movimentos historicamente importantes, não geraram impactos duradouros na ocupação do território.
A ocupação mais recente de Rondônia, iniciada no final da década de 1960, foi promovida por programas de colonização que, em linhas gerais, tinham os seguintes objetivos: i) estabelecer contingentes populacionais na região; ii) promover o crescimento econômico do país, por meio do avanço das fronteiras agrícolas; iii) integrar a região Norte às demais regiões; e iv) a partir das teses militares, ocupar as áreas de fronteira para evitar invasões internacionais.
Para concretizar esses objetivos, as políticas regidas pelo Governo Militar na época eram de derrubar a floresta para ocupar o território com agropecuária. Nesse cenário, vale ressaltar a forte influência de grandes empréstimos oriundos de órgãos multilaterais de desenvolvimento, especialmente o Banco Mundial, que financiaram grande parte do processo de colonização por meio do Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil – POLONOROESTE. Um marco importante desse financiamento foi a construção da BR-364, que liga Cuiabá-MT a Porto Velho-RO.
A pavimentação da BR foi responsável por uma migração massiva no estado e por um grande aumento do desmatamento na região. Análises feitas a partir de imagens de satélites revelam que o desflorestamento em Rondônia, entre os anos de 1980 a 1985, cresceu de 8.000 km2 para 28.000 km2, alcançando, em 1987, 41.000 km2. Em 1998, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Ambiental de Rondônia (SEDAM) estimou que o total desflorestado alcançou 56.112 km2. Segundo o Instituto Ambiental da Amazônia (IPAM, 2022), entre os anos de 2018 e 2021, o desmatamento aumentou 15% em Rondônia, colocando o estado entre os mais desmatados da Amazônia legal nesse período.
A história de ocupação do estado e Rondônia teve outros desdobramentos, também a partir de projetos financiados pelo Banco Mundial, como o PLANAFLORO – Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia. O PLANAFLORO continha uma série de requisitos que objetivavam mitigar os problemas causados pelo POLONOROESTE e incluía importantes objetivos relacionados à proteção ambiental. Embora seja notório os avanços promovidos pelo PLANAFLORO no zoneamento ecológico e econômico do estado, que promoveu a regularização de Unidades de Conservação e demarcação de Terras Indígenas, o projeto não conteve a lógica que promoveu a consolidação do estado – a de que a floresta é uma suposta inimiga do desenvolvimento.
O primeiro órgão ambiental estabelecido no estado de Rondônia foi o Instituto Estadual de Florestas de Rondônia (IEF-RO), criado pela Lei 89/1986, e inicialmente vinculado à Secretaria de Estado da Agricultura – SEAGRI. Em 1987, por meio da Lei Complementar nº 19, surgiu a Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMARO, incorporando o IEF em sua estrutura. Atualmente, a responsabilidade pela formulação e implementação de políticas voltadas para o desenvolvimento ambiental rural e urbano em Rondônia recai sobre a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental – SEDAM. Instituída em 19 de março de 1991 pela Lei Complementar nº 42 e posteriormente reformulada pela Lei Complementar nº 891, de 04 de julho de 2016, a SEDAM tem como objetivos a fiscalização e normatização das atividades relacionadas à qualidade de vida, ao ambiente e aos recursos naturais, além de promover a gestão das Unidades de Conservação do estado.
Para assegurar políticas públicas de preservação ambiental e conservação dos recursos naturais, além da SEDAM, vale ressaltar o relevante papel da Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania (SESDEC), que tem, entre as suas funções, a obrigação de combater crimes ambientais.
Em 1969, bem antes da criação do estado de Rondônia (1981), foi estabelecida a Secretaria de Segurança Pública (SSP). Em 2002, por meio de uma reforma administrativa, foi instituída a Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania (SESDEC), conforme previsto na lei complementar nº 224, de 04 de janeiro de 2000, resultando na extinção da SSP. Com essa alteração, a SESDEC assumiu a responsabilidade pela implementação da política de segurança pública no estado, unificando sob sua liderança a Polícia Civil, a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar.
Nesse contexto, o Batalhão da Polícia Ambiental (BPA), vinculado à Polícia Militar, desempenha um papel crucial no policiamento voltado para questões ambientais, combatendo crimes que afetam a fauna, flora, poluição, mineração e recursos hídricos. Em determinadas operações, o BPA coopera com a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (SEDAM) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A seguir, vejamos o perfil dos Secretários Estaduais de Desenvolvimento Ambiental e, posteriormente, da Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania.
Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental
2019 a 2020: Elias Rezende de Oliveira: Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Luterano de Ji-Paraná (2011), além de especialização em Gestão Pública. Foi Secretário de Estado do Desenvolvimento Ambiental, Policial Penal, Professor da Escola de Estudos e Pesquisas (SEJUS), e Estatutário da Secretaria de Estado de Justiça. Assumiu a SEDAM relatando que o desafio seria destravar os processos de liberação de licenciamentos ambientais, em suas palavras, sem atropelar a legislação. Um dos exemplos logo no início da sua gestão foi a flexibilização com a Instrução Normativa nº 1, de 3 de abril de 2019, que trata sobre o licenciamento ambiental da atividade de extração de cascalho. Elias Rezende de Oliveira deixou a SEDAM para assumir a direção-geral do Departamento Estadual de Estradas de Rodagem e Transporte de Rondônia (DER-RO), a pedido do governador, Coronel Marcos Rocha.
2020 a 2022: Marcílio Leite Lopes: originário de Delfinópolis, Minas Gerais. É graduado pela Universidade Federal de Viçosa-MG, em Engenharia Florestal. Na prefeitura de sua cidade exerceu cargos de chefe do Departamento de Educação, Cultura, Meio Ambiente, Turismo e Esportes na prefeitura de sua cidade. Atuou como Engenheiro Florestal na Superintendência do IBAMA do Estado de Rondônia no período de 2001-2003. Foi nomeado para o cargo de Secretário de Estado do Desenvolvimento Ambiental pelo Governador Marcos Rocha no Decreto de 19 de junho de 2020.
2022 até o presente: Marco Antônio Ribeiro de Menezes Lagos: nasceu em Curitiba-PR, é advogado criminalista, professor universitário de Direito Penal e Processo Penal. Fez cursos na área de Direito Ambiental. Segundo seu próprio relato, Marco Antônio atuava como advogado também na área de crime ambiental. Em 2020, assumiu na Fundação de Amparo ao Desenvolvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e a Pesquisa (FAPERO), a função de assessor técnico da Presidência, uma função similar à de assessor jurídico. Desde fevereiro de 2022, ocupa o cargo de Secretário de Estado do Desenvolvimento Ambiental. Assim como o atual Governador Marcos Rocha (reeleito), que o nomeou, o Secretario publiciza o seu apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro. As suas primeiras declarações como Secretário empossado eram de defesa declarada ao agronegócio, com questionamentos sobre a importância da proteção das Unidades de Conservação. Contudo, em entrevista realizada no dia 16 de abril de 2024, transpareceu adotar um discurso mais moderado, possibilidade de conciliar a produção agropecuária com a conservação ambiental. No entanto, expressa que o maior desafio da SEDAM é a sustentabilidade e encontrar o equilíbrio para o desenvolvimento. Em evento realizado no Acre em 10 de abril de 2024 denominado “Amazônia 30: Ecossistema de Inovação e Restauração Florestal” afirmou que “a floresta em pé não pode ser à custa de fome”. Em entrevista ao Legal, dias após, reafirmou a ideia de que a preservação não pode ser à custa de fome e completa “nem povos tradicionais, nem originários, nem a população em geral do Estado”, já que não existe uma fórmula mágica para a sustentabilidade.
Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania
De 2019 a 2022: José Hélio Cysneiros Pachá: possui formação superior em Letras pela Fundação Universidade Federal de Rondônia. Possui vários cursos de especialização, dentre os quais se destacam os cursos de Operações Especiais, Mergulho Autônomo, Segurança em Campo de Combate e Direitos Humanos, ministrados pela Nações Unidas e SWAT School, sendo o último feito nos Estados Unidos em 2006. Tem duas participações em Missões de Paz da ONU, sendo a primeira em Moçambique no ano de 2004, e a segunda no Timor Leste, em 2003. Foi o criador da Força Tática na Polícia Militar do Estado de Rondônia (PMRO) em março de 2001, implantando-as no 1º e 5º Batalhões de Polícia, em maio de 2003. É Coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado de Rondônia. Pachá foi nomeado Secretário de Segurança desde o início do Governo Marcos Rocha e foi exonerado do cargo de Secretário de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania em 08 de outubro de 2022, com a justificativa de que não estava conseguindo combater a criminalidade no estado, principalmente diante da alta taxa de homicídios e do avanço do crime organizado.
2022 até o presente: Felipe Bernardo Vital: nasceu em Manaus/AM em 05 de dezembro de 1983. Tem graduação em Inteligência e Segurança Pública e MBA em Gestão, Inteligência e Segurança Pública. Possui experiência como negociador em ocorrências envolvendo suicídio e roubos com reféns. Em 2002, iniciou a formação para Oficial Temporário do Exército Brasileiro e em 2003 foi designado para atuar em Porto Velho na 17⸰ Brigada de Infantaria de Selva onde permaneceu até 2009. Em 2009 logrou êxito no Concurso para Oficial do Corpo de Bombeiro Militar do estado de Rondônia. Atualmente é Tenente-Coronel do Corpo de Bombeiros de Rondônia. Em 2018 exerceu a função de Gerente e Inteligência da Casa Militar. Em 2019, atuou como Assessor Especial do Superintendente da SEGEP e, ainda em 2019, foi Consultor Técnico Legislativo da Casa Civil. Foi nomeado para o cargo de Secretário de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania pelo governado Marcos Rocha em 2022, após a exoneração do Coronel Hélio Pachá.
Considerações Finais:
Neste boletim, abordamos de forma abrangente as políticas ambientais e de segurança pública em Rondônia, por meio da análise dos perfis dos secretários estaduais nessas áreas desde 2019 até o presente momento. Uma observação relevante é a aparente falta de prioridade dada à questão ambiental na seleção dos Secretários de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania. Esta abordagem pode ser compreensível, visto que a questão ambiental não costuma ser central nas discussões dessa Secretaria, ainda mais quando os índices de criminalidade urbana em Rondônia são alarmantes. Além disso, mesmo na Secretaria de Desenvolvimento Ambiental, a defesa do meio ambiente enfrenta questionamentos constantes, visto que o desenvolvimento do estado segue atrelado a um modelo que ainda não consegue conciliar produção e conservação. Os interesses econômicos seguem se sobrepondo a interesses ambientais e sociais fundamentais.
Agradecimentos
Iniciativa Amazônia + 10.