Competição eleitoral e dispersão nas eleições do Mato Grosso (Assembleia Legislativa e para Câmara Federal)

Adilson Vagner de Oliveira, Aryeh Hessel Craveiro, Maria Cristina M. de F. Bacovis, Raimundo França

Em 2018, a competição política para a Assembleia Legislativa do Mato (ALMT) e para Câmara dos Deputados pelo Mato Grosso reproduziu, em grande medida, os efeitos da onda bolsonarista que se consagrou vencedora na eleição presidencial, haja vista que os campeões de votos para Assembleia Legislativa e para Câmara dos Deputados apoiaram a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL), especialmente em se tratando da Câmara dos Deputados, cujos candidatos mais votados tinham relação direta com o candidato à Presidência Jair Bolsonaro: Nelson Barbudo (PSL), primeiro mais votado, José Medeiros (PODEMOS), segundo mais votado; e, Victório Galli (PSL), quinto mais votado, mas não eleito.

Com referência à Assembleia Legislativa, ainda que os 4 (quatro) mais votados, a exemplo da campeã, de votos no pleito de 2018, Janaína Riva (MDB), não tivessem diretamente vinculados à onda bolsonarista que venceu as eleições presidenciais, a maior parte dos deputados estaduais foram eleitos no arco de alianças de partidos que apoiavam diretamente o candidato à presidência da República, como PSL, PRB e PSC, DC e/ou indiretamente como DEM.

Esse boletim resulta do monitoramento eleitoral, não apenas dos candidatos mais votados, mas, principalmente, dos competidores mais efetivos em termos de densidade eleitoral, no intuito de compreender como e onde esses candidatos têm maior apelo eleitoral, o qual possibilita suas eleições e reeleições.

Nesse contexto, este boletim faz o recorte para análise das candidaturas de Janaína Riva filiada ao MDB (filha do ex-deputado estadual José Riva, político de quatro mandatos de deputado estadual e com forte influência na política mato-grossense por quase duas décadas) e de Carlos Bezerra, também vinculado ao MDB (ex-governador, ex-senador e em seu 5º mandato como deputado federal).

A deputada estadual Janaína Riva herdou o patrimônio político da família Riva, principalmente na região noroeste de Mato Grosso, reduto tradicional de votos para os membros da família e/ou para seus aliados. A deputada foi eleita para a Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), em 2018, com 51.546 (cinquenta e um mil, quinhentos e quarenta e seis) votos espalhados pelos 141 (cento e quarenta e um) municípios de Mato Grosso, contudo, com zonas distinguíveis de concentração de votos. Trata-se de um fenômeno conhecido nos estudos políticos sobre os efeitos dos redutos eleitorais para a sobrevivência política, por meio da contínua promoção da reputação pessoal dos deputados em bases locais e aproximação estratégica das lideranças municipais da região.

A Tabela 1 exibe os principais pontos de apoio à deputada Janaína Riva nas últimas eleições em Mato Grosso, o município de Juara, sozinho, integralizou mais de 10% ( dez por cento) dos votos válidos da deputada.

Essa região tem sido um reduto tradicional da Família Riva há mais de duas décadas, garantindo a eleição do ex-deputado José Riva por 4 (quatro) mandatos na Assembleia Legislativa de Mato Grosso. O ex-deputado foi preso na cidade de Cuiabá, em 2015, na Operação Metástase, e responde a mais de 100 (cem) processos judiciais; foi condenado a mais de 26 anos de prisão por formação de quadrilha e desvio de dinheiro na ALMT e, desde 2020, cumpre prisão domiciliar. Isso retirou José Riva dos espaços políticos competitivos do Estado, porém, o ex-deputado transferiu à filha, Janaína Riva, parte do espólio político que o sobrenome carrega nessas regiões, o que foi fundamental para a eleição da deputada.

Tabela 1 – Principais mesorregiões de concentração dos votos – deputada estadual Janaína Riva (2018)

Região

Cidade

Quantidade de Votos

Porcentagem

Noroeste

Aripuanã

733

1,42%

Noroeste

Juína

481

0,93%

Noroeste

Brasnorte

1279

2,48%

Noroeste

Juara

5223

10,13%

Noroeste

Porto dos Gaúchos

1042

2,02%

Noroeste

Tabaporã

1008

1,96%

Noroeste

Colíder

794

1,54%

Centro-Sul

Rondonópolis

849

1,65%

Centro-Sul

Cuiabá

1381

2,68%

Centro-Sul

Várzea Grande

1339

2,60%

Centro-Sul

Poconé

784

1,52%

Sudeste

Barra do Garça

786

1,52%

Sudeste

Primavera do Leste

1457

2,83%

Sudeste

Novo São Joaquim

941

1,83%

Sudeste

Campinápolis

681

1,32%

Sudeste

Nova Xavantina

594

1,15%

    
FONTE: Adaptado dos TSE pelos pesquisadores do Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia (LEGAL -MT), 2022

Janaína Riva (MDB) foi a única mulher eleita para a 18ª Legislatura na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (2015-2019), tornou-se a primeira mulher a assumir a presidência da Mesa Diretora da Casa e a primeira a ocupar o cargo de vice-presidente da Assembleia no Biênio 2019/2020. A deputada conquistou muitos votos dos servidores públicos estaduais, ao tomar como pauta de ação a defesa pelo Reajuste Geral Anual (RGA), além de crescer significativamente na política com a pauta de defesa das mulheres, luta por ampliação da presença feminina nos espaços de poder e nas medidas de controle contra a violência e demais agressões às mulheres de Mato Grosso.

Mapa 1 – votos por municípios atribuídos a Janaína Riva (cargo de deputado estadual) – eleições de 2018
FONTE: Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal, 2022.

Em 2022, a deputada estadual volta a disputar o cargo visando sua reeleição para Assembleia Legislativa de Mato Grosso por mais um mandato, com vislumbre que concorrerá ao governo do Estado de Mato Grosso em 2026. A possibilidade de que Janaína Riva obtenha, novamente, o maior número de votos na eleição para o legislativo estadual, em 2022, é factível, demonstrando a consolidação da deputada no cenário político atual.

A dispersão dos votos da deputada Janaína Riva (MDB), por todo o Mato Grosso, demonstra o alcance de sua atuação ao longo de seus 2 (dois) mandatos na ALMT, contudo, percebe-se que seus redutos eleitorais tradicionais influenciaram sobremaneira os seus resultados eleitorais. A história política da família Riva em Juara-MT sempre esteve atrelada à manutenção de propriedades urbanas e rurais no município, permitindo assim a constante interação da deputada com a região e suas lideranças locais, o que a tem mantido à frente da competição política na região e, também, como principal nome para o legislativo do Estado.

Embora a deputada tenha tido votações relevantes nas 3 (três) maiores cidades de Mato Grosso, ou seja, Cuiabá, Várzea Grande e Rondonópolis, a somatória de votos desses 3 (três) municípios aproximou-se de 7% (sete por cento) de seus votos no Estado, em contraste à cidade de Juara que garantiu sozinha mais de 10% (dez por cento) de seus votos na última eleição.

Aos poucos, Janaína Riva desprende-se da imagem de seu pai e ascende politicamente por meio de uma atuação consolidada na Assembleia Legislativa de Mato Grosso e na sua aliança com o atual governador, Mauro Mendes (União Brasil).

Em relação à disputa por vagas à Câmara dos Deputados, também se observa a necessidade de capilarização de votos pelo interior do Estado para que um candidato seja eleito; isso foi constatado na distribuição dos votos do deputado federal Carlos Bezerra nas eleições de 2018.

Nesse caso, ter uma boa votação no interior é fundamental para ter êxito na disputa ao cargo de deputado federal, pois além da necessidade de atingir o quociente eleitoral que nas eleições de 2018 em Mato Grosso foi de 148.000 (cento e quarenta e oito mil votos), há somente 8 (oito) cadeiras em disputa no Estado. Assim sendo, à exceção de Cuiabá e Várzea Grande que têm densidade eleitoral superior ao quociente, nenhum dos demais 139 (cento e trinta e nove) municípios teria condições de eleger, sozinho, um deputado federal, diferentemente da disputa para as 24 (vinte e quatro) cadeiras de deputado estadual que teve um quociente eleitoral de 49.000 (quarenta e nove mil) votos, nas eleições de 2018. Nesse caso, municípios como Sinop, Rondonópolis, Cuiabá, Várzea Grande, Cáceres, Tangará da Serra, Sorriso e Barra do Garças teriam, por si só, condições de eleger um ou mais deputados estaduais.

Embora não tenha sido o candidato mais votado nas eleições de 2018, para Câmara dos Deputados, Carlos Bezerra é um político de bastante expressão no Estado, está em seu 5º mandato como deputado federal, tendo sido senador (1995-2003), deputado estadual (1975-1979), governador de Mato Grosso (1987-1990), além de ter ocupado o cargo de prefeito de Rondonópolis por 2 (duas) gestões em 1983 e 1993. Não obstante ter nascido em Chapada dos Guimarães, cidade a 65 km de Cuiabá, seus votos para deputado federal, na eleição de 2018, concentraram-se em municípios do norte do Estado.

A tabela 2 demonstra a dispersão dos votos no norte de Mato Grosso, e revela o baixo desempenho do deputado nas maiores cidades do Estado, mesmo em Rondonópolis, 3º município mais populoso de Mato Grosso, a quantidade de votos correspondeu a apenas 2,4% (dois vírgula quatro por cento) do total de sua votação, se comparado com Guarantã do Norte, município no qual o deputado recebeu 3.254 (três mil, duzentos e cinquenta e quatro) votos, ou seja, 5,5% (cinco vírgula cinco por cento) do total de seus votos; o papel que a capital Cuiabá e a região metropolitana desempenharam em sua eleição em 2018 foi pouco significativo.

Tabela 2 – Regiões de concentração dos votos – deputado federal Carlos Bezerra (2018)

Região

Cidade

Quantidade de Votos

Porcentagem

Norte

Cotriguaçu

732

1,24%

Norte

Nova Bandeirante

834

1,4%

Norte

Alta Floresta

1864

3,15%

Norte

Guarantã do Norte

3254

5,5%

Norte

Novo Mundo

813

1,37%

Norte

Matupá

1430

2,42%

Norte

Peixoto de Azevedo

2211

3,74%

Norte

Marcelândia

2101

3,55%

Norte

Colíder

1205

2,04%

Norte

Terra Nova do Norte

1077

1,82%

Centro-Sul

Cuiabá

842

1,42%

Centro-Sul

Várzea Grande

907

1,53%

Centro-Sul

Rondonópolis

1417

2,4%

FONTE: Adaptado dos TSE pelos pesquisadores do Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia/LEGAL -MT, 2022

O reduto eleitoral de Carlos Bezerra pode ser considerado uma área de baixa influência de outros candidatos à Câmara dos Deputados portanto, não representa necessariamente a região de origem do político ou de sua maior atuação legislativa no que se refere aos repasses financeiros.

Mapa 2 – votos por municípios atribuídos a Carlos Bezerra (cargo de deputado federal) – eleições de 2018
FONTE: Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal, 2022.

É importante frisar que Carlos Bezerra manteve-se, ao longo de sua trajetória política, sempre filiado ao Movimento Democrático Brasileiro. Além disso, na maior parte de seu percurso político, afirmou-se como o principal dirigente do MDB em Mato Grosso, tendo forte influência no Partido junto à Direção Nacional do MDB. Já Janaína Riva teve sua primeira eleição filiada ao Partido Social Democrático (2014) e, em 2016, migrou para Movimento Democrático Brasileiro.

Importante destacar que na análise da competição eleitoral em termos de dados brutos, isto é, na verificação de como o eleitor mato-grossense votou nas eleições de 2018 para os cargos de deputado estadual e deputado federal, observou-se que, tanto para um cargo quanto para o outro, o comportamento do eleitorado dirigiu-se à escolha por candidatos mais próximos geograficamente dele, podendo ser caracterizado voto “distrital” (o que em termos legais não há no ordenamento jurídico brasileiro); esse fenômeno pode ser observado nos Mapas 4 e 5.

Mapa 3 – candidatos a deputado estadual mais votados por municípios de Mato Grosso – Eleições de 2018
FONTE: Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal, 2022.
Mapa 4 – candidatos a deputado federal mais votados por municípios do Mato Grosso
FONTE: Laboratório de Estudos Geopolíticos da Amazônia Legal, 2022.

Conquistar os votos no interior do Estado tem sido uma estratégia indispensável para a manutenção de resultados positivos nas eleições para deputados estaduais e federais, pois a dispersão dos votos na capital e em regiões metropolitanas tem dificultado a obtenção de farta votação nas últimas eleições. Esse fenômeno obriga os candidatos ao Legislativo construir ou manter redutos eleitorais no interior do Estado, áreas de concentração para a interação com o eleitorado local e suas lideranças, como alternativa à competição nos grandes centros urbanos de Mato Grosso.

Em síntese, ao se analisar a dispersão de votos em Mato Grosso para ALMT e Câmara dos Deputados nas eleições de 2018, observou-se que expandir os votos para além de sua circunscrição eleitoral foi essencial para o sucesso nas urnas dos 2 (dois) deputados aqui evidenciados. Assim, considera-se que a capilaridade eleitoral é condição imprescindível para o êxito nas eleições.