João Paulo S. L. Viana; Patrícia M.C. Vasconcellos; Melissa V. Curi; Jamila Martini
A Assembleia Legislativa de Rondônia é composta por 24 deputados estaduais. Rondônia é um estado de formação recente e a primeira eleição como estado ocorre em 15 de novembro de 1982. Na ocasião, foram eleitos 24 deputados estaduais para a Assembleia Legislativa, composição numérica mantida até a atualidade. O primeiro governador foi o Coronel Jorge Teixeira, o que demonstra a força da presença militar em um território a ser desbravado pelos “destemidos pioneiros”, como é cantado no hino do estado.
Nos traços de uma política conservadora, uma visão de desenvolvimento também de caráter conservador, isto é, sem inovações e sem a preocupação com a preservação dos recursos naturais locais e com as populações nativas (tradicionais e indígenas) que já ocupam a região muito antes dos programas de avanço das fronteiras agrícolas serem implementados em Rondônia.
Isso se dá, em parte, porque os debates nacionais e internacionais sobre desenvolvimento sustentável e preservação do meio ambiente somente foram consolidados nas décadas seguintes. Mas, vale considerar, que o caráter conservador de concepção de crescimento econômico como sinônimo de desenvolvimento, que concebia a floresta como um “inferno verde” e que, portanto, deveria ser derrubada, afastava (e ainda afasta) a identidade amazônica das proposições legislativas.
Na atual legislatura (2019-2021), o estado de Rondônia, considerado um estado com alto potencial para o desenvolvimento do agronegócio, pelo seu alinhamento político, une-se a postura do Governo Federal e oportuniza a implementação de políticas anti-meio ambiente e anti-indígena no estado.
Das principais temáticas propostas na Assembleia Legislativa de Rondônia, no período analisado, destacam-se os relacionados a: Economia e Orçamento, seguida por Política e Administração Pública e Saúde. Em quarto lugar, considerando o decreto de estado de pandemia, a partir de 2020, encontram-se os projetos relacionados a COVID-19. Há mais proposições relacionadas a honoríficos e simbólicos do que alusivas à segurança, meio ambiente e energia e direitos humanos.
Gráfico 1 – Principais temáticas dos Projetos da ALE/RO: iniciadas e aprovadas (2019 a 2021)
(Fonte: Levantamento de dados legislativos do LEGAL)
Dentre as proposições da ALE-RO, no período de 2019 a 2021, vemos que meio ambiente e energia ocupam pouco espaço na pauta, aproximadamente 3,83% do total. Ainda que as proposições sejam poucas, são propostas de alto impacto e consequências imediatas para o território e para a população tradicional. Em 2020, foi proposta o PLC n0 80/2020, que alterava os limites da Reserva Extrativista Jaci-Paraná e do Parque Estadual de Guajará-Mirim. As áreas citadas seriam reduzidas em cerca de 220 mil hectares. São territórios que envolvem disputa de terras, invasões e criação de gado. A iniciativa do poder executivo foi aprovada, mas declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça de Rondônia, após ação do Ministério Público do Estado.
Outras propostas demonstram a visão ambiental do legislativo. Em 2021, os deputados de RO vetaram a destruição de máquinas e equipamentos apreendidos em operações ambientais em Rondônia (PL n0 1511/2021); decidiram pela redução de áreas de reservas ambientais – Projeto de Lei Complementar (PLC) n0 104/2021, que extingue por completo o Parque Estadual Ilha das Flores, com 89.789 mil hectares; e PLC n0 105/2021, que reduz em 6.566 hectares da área proposta para a Reserva do Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Limoeiro, em tentavas sistemáticas de redução de áreas de preservação ambiental e de territórios indígenas.
Outra discussão que ressoa no legislativo, como pauta antiga, mas ganhando ainda mais força por conta do posicionamento do Governo Federal, é sobre a liberação de garimpo em terras indígenas. O PL n0 191/20, de autoria do Poder Executivo, que trata, dentre outros, da realização da pesquisa e da lavra de recursos minerais em terras indígenas, tem impulsionado um maior debate dentro do legislativo. No dia 08 de dezembro de 2021, o presidente da Assembleia, deputado Alex Redano (Republicanos) liderou uma Audiência Pública para tratar da temática, com a maciça manifestação de deputados e outros presentes a favor da liberação.
Diante desse cenário, pode-se afirmar que, depois do Regime Militar, nenhum outro governo foi tão prejudicial às pautas ambientais e indígenas no país, com reflexos diretos nos estados, como podemos ver pelas proposituras da ALE-RO. O atual Governo Federal não apenas faz “vistas grossas” à violação dos direitos ambientais e indígenas, como outros governos fizeram, mas incorporou ao seu discurso oficial a desregulamentação da legislação ambiental e o incentivo à invasão das áreas indígenas.
A maioria das propostas na Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia é apresentada pelos deputados estaduais, 59%. O Executivo é responsável por 38% das iniciativas.
Gráfico 2 – Autoria das Propostas na Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia
(Fonte: Levantamento de dados legislativos do LEGAL)
Há diferenças de agenda nas proposições do Executivo e do Legislativo, contudo, as manifestações mais recentes dos deputados estaduais e do próprio Governador do Estado, o ex-coronel Marcos Rocha, demonstram o alinhamento com os posicionamentos de ultradireita do Governo Federal. Como exemplo, pode-se citar a Lei 5.179/2021, que veta, no estado de Rondônia, a implementação ou a exigência de passaporte sanitário e o tratamento diferenciado a qualquer pessoa que recusar vacina contra a Covid-19. Esta medida, além de alinhada com os preceitos do Governo, gerou elogio público do Presidente Bolsonaro ao estado de Rondônia.
Os deputados estaduais de Rondônia também aprovaram outras medidas defendidas pela “bancada bolsonarista” no Congresso Nacional: proibiram o uso da linguagem neutra nas escolas públicas e privadas do estado, com previsão de sanções para as escolas e professores que desobedecerem (Lei 5.123/2021). A respeito da proibição da linguagem neutra, vale mencionar que o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia consideraram a matéria inconstitucional. Cabe frisar que o judiciário tem efetivamente exercido o poder de controlar os abusos legislativos e frear a perda de direitos humanos.
A taxa de aprovação dos projetos propostos pelo Executivo é de 77,5% e, dos deputados estaduais, 31,6%. O tempo médio de aprovação do Executivo é de aproximadamente 28 dias, enquanto que para o Legislativo quase 134 dias.
Gráfico 3 – Taxa de sucesso por propositor
(Fonte: Levantamento de dados legislativos do LEGAL)
Ainda na esfera de alinhamento bolsonarista, agora no campo religioso da pressão evangélica no país, reforçada pelas manifestações públicas da equipe presidencial, no dia 9 de dezembro de 2021, o presidente da Assembleia, que é adventista, organizou uma espécie de culto em homenagem aos “serviços sociais e espirituais” prestados pelas igrejas evangélicas durante a pandemia. O evento teve louvores e orações na tribuna. Assim, a Casa Legislativa esquece a separação necessária entre política e religião. O estado, ferindo preceitos constitucionais, deixa de ser laico e expõe suas preferências.
Diante do exposto, não resta dúvida que a política legislativa em exercício no estado de Rondônia apresenta um alinhamento ideológico e concreto, diante de suas proposições, com a política do presidente Jair Bolsonaro. As principais pautas bolsonaristas são refletidas na ALE-RO, desde políticas que incentivam a degradação ambiental e exploração das terras indígenas, até manifestações de preferências religiosas e propostas negacionistas diante da pandemia da COVID-19, como falta de incentivo à vacinação, distribuição de “kit Covid” para suposta prevenção à doença e pressão ao não isolamento social, que levou o estado a momentos críticos de contaminação e à superlotação dos hospitais e altos índices dos registros de mortes pela doença.
Referências
ALE/RO. Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia. Disponível em: <https://www.al.ro.leg.br/>.
VIANA, João Paulo Saraiva Leão; CURI, Melissa Volpato; MARTINI, Jamila; O Bolsonarismo nos parlamentos estaduais: a agenda ultraconservadora da Assembleia Legislativa de Rondônia. Blog Legis-Ativo: portal do jornal O Estado de S. Paulo (Estadão). São Paulo: 11 de Janeiro de 2022.