Luci Maria Teston, Ermício Sena, Manoel Valdemiro F. Rocha e Rosa Indira Alves
O nível de institucionalização do sistema partidário a partir do olhar aos subsistemas estaduais tem chamado cada vez mais a atenção de pesquisadores. Entender como os eleitores votam de uma eleição para a outra nos partidos torna-se importante, uma vez que as preferências do eleitorado determinam, em grande medida, o nível de fragmentação (muitos ou poucos partidos) e de volatilidade eleitoral (mudança de voto).
Para identificar a fragmentação partidária é utilizado o índice do Número Efetivo de Partidos (NEP), desenvolvido por Laakso e Taagepera (1979). Pelo NEP podem ser mensurados quantos partidos foram efetivamente competitivos na conquista por votos. A principal preocupação dos cientistas políticos quando criaram o índice foi identificar quais partidos verdadeiramente possuem algum grau de importância na competição eleitoral a partir da efetivação de parlamentares destes partidos nas cadeiras das casas legislativas. Partidos que não tiveram uma votação significativa para galgar assentos não deveriam ser considerados partidos efetivos do sistema partidário.
Já a volatilidade eleitoral está relacionada à mudança agregada de votos em um partido considerando duas eleições consecutivas. É um indicador que ajuda a compreender a institucionalização de um sistema partidário nos regimes democráticos e a mensurar a estabilidade dos padrões de competição partidária nos sistemas políticos, bem como a fidelidade do eleitor aos partidos.
Em democracias fragilizadas observa-se um alto índice de volatilidade, resultando em sistemas partidários instáveis, com eleitores com nível de fidelização mais baixo e precário enraizamento dos partidos na sociedade. Um sistema partidário mais estável indica que os partidos políticos que disputam as eleições obtêm êxito na missão de canalizar de forma efetiva as preferências dos eleitores, ou seja, são instrumentos importantes na formação da preferência do eleitor.
Para calcular a volatilidade eleitoral é usada a metodologia desenvolvida por Pedersen (1979) que mede a relação de permanência ou de mudança da fidelidade do eleitor a determinado partido, buscando identificar se um sistema partidário, através da força dos partidos, tinha estabilidade ou se alterava entre eleições. Quanto maior a volatilidade da votação nos partidos entre eleições, maior a instabilidade do sistema partidário.
Índices de volatilidade maiores indicam menor possibilidade de os partidos políticos terem enraizamento social, o que ocorre quando o índice se encontra acima de 30 pontos. A escala vai de 0 a 100 e, quanto mais próximos de 0 estão os resultados, mais estáveis são as preferências do eleitor.
Neste sentido, torna-se importante identificar as particularidades da política subnacional em reação à dinâmica eleitoral. Neste estudo, serão observadas as últimas eleições à Assembleia Legislativa do Estado do Acre.
Volatilidade e fragmentação partidária na Aleac
Quando se observa o Número Efetivo de Partidos na Assembleia Legislativa do Acre, percebe-se uma alta oscilação no período analisado (2002 a 2018). Entretanto, as Legislaturas 11ª (1999-2003) e 12ª (2003-2007) se mantiveram nos mesmos patamares de dispersão do voto para deputado estadual, tendo uma oscilação mínima de nove partidos efetivos para 10 partidos efetivos (gráfico 1).
Gráfico 1 – Número de Partidos Efetivos nas eleições para a Assembleia Legislativa do Acre (2002-2018)
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral. Elaboração própria.
A partir da 13ª Legislatura (2011-2015), passa a ocorrer um fenômeno marcado por grande dispersão de votos. Nesta legislatura, se comparada à anterior, há uma mudança significativa de 10 partidos efetivos para 13 partidos efetivos na Assembleia. Se, por um lado, este aumento significativo no número de partidos efetivos pode ser visto como uma prova do multipartidarismo presente no subsistema partidário acreano, por outro, revela o aumento dos partidos apelidados de nanicos na contenda eleitoral.
Isso se dá, em grande medida, devido a estratégias individualmente montadas por candidatos para formarem alianças com outros partidos da mesma envergadura e alcançarem os coeficientes necessários à eleição ao pleito estadual. Se na 12ª Legislatura estes partidos elegeram cinco deputados, candidatos pelas legendas PMN, PPS e PTN, já na 13ª Legislatura, o número de deputados eleitos por esses partidos salta para sete deputados, candidatos pelas legendas PRP, PMN, PSC, PT do B e PSDC.
Outra explicação para o aumento dos partidos efetivos nas eleições para a Assembleia legislativa é a estratégia inaugurada pela Frente Popular do Acre (FPA), aliança liderada pelo Partido dos Trabalhadores e que governou o Estado de 1999 a 2018. Esta frente de partidos adotava como um de seus critérios congregar um grande número de partidos em coligações para eleger o maior número possível de deputados estaduais.
Para corroborar com essa assertiva, basta verificar que na primeira eleição da FPA em 1998, destes partidos considerados nanicos, apenas o PMN elegeu parlamentar para a Assembleia Legislativa. Já na última eleição de 2018, onde a FPA foi derrotada, destes partidos citados, apenas PROS e PSC elegeram parlamentares estaduais.
No campo da fragmentação partidária, também ganha importância o índice do Número de Partidos Parlamentares Efetivos, que compreende as agremiações partidárias que verdadeiramente tem força, influência e capacidade de formar coalizões no interior do parlamento para fazer valer suas posições. No Acre, o Número de Partidos Parlamentares Efetivos na Assembleia Legislativa teve pouca oscilação se considerado o período de 2002 a 2018 (gráfico 2).
Em 2002 o Número de Partidos Parlamentares Efetivos foi de 10 agremiações, reduzindo para sete agremiações em 2006 e novamente aumentando em 2010 para 12 partidos. Em 2014 manteve-se estável com 11 partidos e em 2018 apresentou um aumento para 13 partidos.
Pode-se considerar que no período analisado houve um baixo número de Partidos Parlamentares Efetivos na Assembleia Legislativa do Acre, o que dialoga com um dos elementos já citados anteriormente, que é estratégia da FPA de criar várias coligações entre os partidos nanicos e, assim, garantir a governabilidade.
Gráfico 2 – Número de Partidos Parlamentares Efetivos para a Assembleia Legislativa do Acre (2002-2018)
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral. Elaboração própria.
A literatura que trata sobre o comportamento do eleitor com relação ao voto nos partidos políticos aponta que a volatilidade é um bom indicador da institucionalização ou não de um sistema partidário numa democracia, ou seja, a qualidade da poliarquia de uma determinada sociedade teria um débito com o grau de enraizamento dos partidos políticos e da baixa oscilação das preferencias eleitorais de uma eleição a outra.
A menor oscilação das preferências dos eleitores de um dado sistema eleitoral (baixa volatilidade), indica que os partidos políticos participantes do jogo eleitoral conseguem obter êxito na lealdade do eleitor, atuando como um canal de ressonância das preferências desse eleitorado. Por outro lado, uma maior oscilação das preferências eleitorais (alta volatilidade), indicaria que os partidos políticos participantes do jogo eleitoral não conseguem obter êxito na lealdade do eleitor e, portanto, não há o estabelecimento de conexão com suas preferências.
Quando é observado o comportamento do eleitor acreano no período de 2002 a 2018 para eleger deputados estaduais, verifica-se uma tendência de acréscimo da taxa de volatilidade de uma eleição para a outra. Percebe-se que na eleição de 2002 para 2006, início da série histórica deste estudo, houve a menor taxa de volatilidade, de 22,6 pontos. Na eleição de 2006 para 2010 correspondeu a 25,34 pontos e, na de 2010 para 2014, refletiu 28,99 pontos. Já na eleição de 2014 para 2018 correspondeu a maior taxa do período, de 32,61, mantendo-se uma progressão de três pontos para cima de um par de eleição para a outra (gráfico 3).
Gráfico 3 – Índice de volatilidade eleitoral do Acre para a Assembleia Legislativa (1998-2018)
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral. Elaboração própria.
Essa tendência da alta do índice de volatilidade eleitoral no Acre pode ser explicada por vários fatores. Podem ser apontados como principais as migrações partidárias existentes de uma eleição a outra por parlamentares eleitos, que dialoga com a estratégia da FPA no período estudado, que consistia em conjugar em várias coligações diferentes partidos considerados nanicos, sem nenhuma lealdade dos participantes do ponto de vista programático.
Padrões mais estáveis conferem maior previsibilidade às disputas eleitorais e dificultam uma escalada de outsiders e de lideranças personalistas sem vínculos sólidos e duradouros com os partidos políticos.
Essa baixa lealdade partidária dos parlamentares eleitos, que trocaram de partidos com muita frequência, certamente é um dado bastante convincente da alta volatilidade constatada no período analisado, mas ela também diz muito sobre o comportamento do eleitor acreano, que tem uma tendência muito forte de votar de forma personalizada, preferindo orientar seu voto mais nos candidatos do que nos partidos políticos.
Com o fim da FPA e a derrota do grupo político liderado pelo Partido dos Trabalhadores no Acre, ocorrida no pleito de 2018, as eleições de 2022 serão uma oportunidade para identificar se essa tendência de aumento da volatilidade do voto do eleitor acreano irá se manter ou se, com a atual polarização da política, ocorrerá um rearranjo das forças eleitorais, no sentido da concentração do voto em determinadas legendas, que representam esta conflagração que se avizinha com o jogo eleitoral de 2022.
Referências
LAAKSO, Markku; TAAGEPERA, Rein. The “effective” number of political parties: a measure with application to West Europa. Comparative Political Studies, v. 12, n. 1, p. 3-27, 1979.
PEDERSEN, Mogens. The Dynamics of European Party Systems: changing patterns of electoral volatility. In: European Journal of Political Research. Odense (Dinamarca): Odense University. v. 7, 1979.