Luci Maria Teston, Valdemiro Rocha e Rodrigo Forneck
As eleições municipais deste ano se aproximam e as articulações em torno das candidaturas para prefeito se intensificam, possibilitando o desenho de possíveis cenários. Com a definição do domicílio eleitoral, filiações e desfiliações partidárias, se avizinha o período das convenções partidárias e dos registros de candidaturas.
Este texto tem o propósito de descrever as movimentações em torno das duas principais pré-candidaturas à prefeitura de Rio Branco, capital do Acre, considerando três elementos de análise: a) espectro ideológico dos partidos vinculados aos dois principais pré-candidatos; b) agrupamentos familiares apoiadores das pré-candidaturas; c) possibilidade de incidência da pauta ambiental no debate eleitoral. As perspectivas apresentadas visam retratar o cenário atual considerando como recorte o fim do mês de maio de 2024, ocasião em que o boletim foi produzido. Representam o retrato daquele momento no processo eleitoral envolvendo a disputa à capital, Rio Branco.
Com 45% do eleitorado do Acre, o município de Rio Branco é uma base eleitoral importante para os candidatos quem almejam se consolidar na política acreana e projetar posições de destaque no cenário político estadual e nacional. Muitos veem o governo municipal como uma janela de oportunidades para galgar uma vaga no senado ou mesmo para lançar-se ao governo do estado. Este é um caminho percorrido por diversos candidatos, com resultados em termos de sucesso igualmente diversos.
1 – Carreira política, vinculação partidária e nacionalização da disputa na capital Rio Branco
Para as eleições deste ano, dois pré-candidatos competitivos estão sendo apresentados até o momento: Marcus Alexandre (MDB) e Tião Bocalom (PL).
O atual prefeito, Tião Bocalom, iniciou sua carreira política como vereador em Nova Olímpia, no Paraná, na década de 1980. Com formação em Matemática e em Ciências Físicas e Biológicas, foi eleito o primeiro prefeito do município de Acrelândia – distante 100km da capital Rio Branco – nas eleições de 1992 pelo antigo PPR. Eleito novamente à prefeitura de Acrelândia em 2000 e reeleito em 2004, exerceu o mandato até 2006, ano em que perde a disputa ao governo do estado do Acre.
O atual prefeito disputou mais duas vezes o governo do estado do Acre (2010 e 2014) e outras duas a prefeitura de Rio Branco (2008 e 2012), antes de vencer a então prefeita e atual deputada federal Socorri Néri em 2020, pelo Partido Progressistas (PP). Em sua trajetória política, Bocalom esteve filiado ao PPR, PSDB, DEM, PP e, no contexto eleitoral deste ano, é pré-candidato do PL.
A filiação de Tião Bocalom ao PL contou com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro, que esteve em Rio Branco em março deste ano para participar do ato de filiação. Na ocasião, o atual prefeito reforçou que a vinda de Bolsonaro fortaleceria a sua pré-candidatura à prefeitura de Rio Branco, demonstrando haver um indicativo de nacionalização da disputa eleitoral na capital por meio da polarização entre Bolsonaro e Lula.
A entrada de Bocalom ao PL se deu em um contexto de desgaste do atual prefeito dentro do PP. Em setembro do ano passado, o Progressistas já sinalizava pela possível expulsão de Tião Bocalom do partido por infidelidade partidária, além do fato de ter escolhido, à época, outro candidato para disputar as eleições municipais em Rio Branco: o secretário de Estado de Governo de Gladson Cameli (PP), Alysson Bestene.
No entanto, recentemente, o governador Gladson Cameli (PP) se posicionou como apoiador da pré-candidatura de Tião Bocalom, saindo da neutralidade até então adotada e articulando uma aliança eleitoral do Progressistas com o PL a partir da indicação de Alysson Bestene (PP) como vice na chapa. Além do PL e PP, há ao menos outros sete partidos apoiadores da pré-candidatura: União Brasil, Podemos, PSDB, DC, Solidariedade, PDT e Cidadania.
A filiação de Bocalom ao PL sinaliza a intenção do prefeito em se alinhar e buscar identificação com os eleitores que votam em Bolsonaro. Segundo pesquisa divulgada em abril deste ano, 48,9% dos eleitores acreanos rejeitam o presidente Lula. A pesquisa – realizada pela Data Control Instituto de Pesquisa -, mostra que apenas 20,9% dos eleitores da capital aprovam o governo Lula. A densa presença do voto evangélico e a vinda de Jair Bolsonaro ao estado, associada à falta de representação parlamentar de partidos vinculados ao espectro ideológico da esquerda podem ser fatores explicativos para os resultados da pesquisa envolvendo a escolha dos candidatos pelos eleitores. Para Bocalom, conseguir vincular seu nome ao do ex-presidente Bolsonaro pode ser uma aposta importante no sentido de obter sucesso na reeleição, apesar de que, historicamente, as eleições no Acre não tendam a ser influenciadas pelo cenário nacional.
O principal oponente de Tião Bocalom é Marcus Alexandre, pré-candidato pelo MDB. Engenheiro civil por formação, Marcus foi duas vezes prefeito de Rio Branco pelo PT, exercendo o mandato entre 2013 e 2018. Nas eleições municipais de 2012, derrotou Bocalom (PSDB) na disputa à prefeitura da capital. Em 2018 renunciou ao cargo de prefeito de Rio Branco para disputar o governo do estado pelo PT, sofrendo sua primeira derrota eleitoral, ainda no primeiro turno, pelo então senador e atual governador reeleito Gladson Cameli (PP). Nas eleições gerais de 2022 foi vice de Jorge Viana (PT) na disputa ao governo do estado. Conta até então com uma ampla aliança envolvendo dez partidos apoiadores de sua pré-candidatura: Agir, PRD, PSOL, PT, PCdoB, PSD, PSB, PV, MDB e REDE.
Em dezembro de 2022, Marcus Alexandre solicitou a desfiliação do PT para assumir um cargo público no Tribunal Regional Eleitoral. Após oito meses, em agosto de 2023, tomou a decisão de filiar-se ao MDB, provocando movimentações na correlação de forças envolvendo a disputa à prefeitura da capital. Com a entrada de Marcus Alexandre na legenda, diversos quadros do MDB que se candidataram a cargos eletivos em 2022 pediram desfiliação. Podem ser citados como exemplos o deputado estadual Emerson Jarude, a ex-deputada federal Mara Rocha e o ex-deputado federal e vice-governador no primeiro mandato de Gladson Cameli, Major Wherles Rocha. As razões da saída envolvem a decisão do MDB de apoiar o nome de Marcus Alexandre na disputa ao governo da capital em um contexto de decisão do partido em caminhar com partidos de esquerda.
Em maio, a Executiva Nacional do PT definiu o apoio à pré-candidatura de Marcus Alexandre. Portanto, no Acre, o PT não terá candidatura própria e os eleitores que depositam seus votos em partidos ideologicamente vinculados ao campo da esquerda, em tese, terão Marcus Alexandre como uma opção de voto. Outro aliado do pré-candidato é o senador Sérgio Petecão (PSD), que tem manifestado apoio à candidatura do emedebista e, muito provavelmente, indicará a vice do PSD na chapa de Marcus.
A vice atualmente cotada é a engenheira civil Yael Saraiva Lima, líder do Ministério dos Jovens da Assembleia de Deus. Yael é casada com o pastor Marcos Lima e nora do pastor e presidente da Assembleia de Deus no Acre, Luiz Gonzaga. Filiada ao PSD, mesmo partido do Senador Sérgio Petecão, foi candidata à deputada estadual nas eleições gerais de 2022. A estratégia tende a ser uma aliança eleitoral com um vice que atraia parte do eleitorado conservador. Se confirmado o cenário de indicação de Yael como vice, haveria a possibilidade de disputa ao voto evangélico conservador.
Dados divulgados pelo IBGE decorrentes do Censo 2022 e publicizados em site estadual, mostram o Acre com o maior número de igrejas por habitante do Brasil. A média, no estado, é de 554 igrejas para cada 100 mil habitantes, quase o dobro da média nacional, que é de 286 igrejas para cada 100 mil habitantes.
2 – Grupos e famílias políticas em disputa na capital
A pré-candidatura de Marcus Alexandre conta com o apoio de agrupamentos familiares importantes. Um deles é a família Melo, por meio do presidente estadual do MDB, Flaviano Melo, eleito pelos partidos da aliança que apoiam a pré-candidatura de Marcus para coordenar a campanha do emedebista.
A família Melo tem como liderança histórica Raimundo Hermínio de Melo (MDB), que foi deputado estadual por 20 anos. Seu herdeiro político, Flaviano Melo, possui 40 anos de vida pública. Foi nomeado pelo governador Nabor Junior à prefeitura de Rio Branco. Após a nomeação ao cargo de prefeito, foi eleito governador, senador, prefeito de Rio Branco e deputado federal por três mandatos. Na eleição geral de 2022 Flaviano concorreu novamente a uma vaga para deputado federal, porém, desta vez não obteve sucesso nas urnas. Entretanto, continua exercendo forte influência política dentro do MDB.
Com o PT apoiando sua pré-candidatura, Marcus Alexandre ainda conta com a força política da família Viana a partir do engenheiro florestal Jorge Viana, eleito prefeito de Rio Branco, senador e governador do estado do Acre por dois mandatos consecutivos.
Agrupamentos familiares tradicionais também apoiam a pré-candidatura de Tião Bocalom à prefeitura de Rio Branco. Uma destas famílias é a Bestene, considerada um caso de sucesso em termos de manutenção de poder. A influência teve início a partir do médico Félix Bestene, eleito por duas legislaturas para a Assembleia Legislativa do Acre. O seu sobrinho e herdeiro político, José Bestene foi eleito em quatro oportunidades deputado estadual, chegando a ser presidente da Assembleia Legislativa. Alysson Bestene, atual pré-candidato à vice-prefeito na chapa com Tião Bocalom, é sobrinho de José Bestene. Alysson já foi vereador de Rio Branco, Secretário Estadual de Saúde, Secretário de Assuntos Estratégicos do Governo e chegou a ser cotado para ser vice-governador na chapa de Gladson Cameli (PP) na eleição de 2022.
Além dos Bestene, Bocalom também conta com o apoio da família Cameli, a partir do apoio do governador à sua reeleição. Composta por empresários bem-sucedidos, a história familiar na política inicia com Orleir Messias Cameli, ex-prefeito de Cruzeiro do Sul e ex-governador do Estado. Atualmente, a família Cameli é representada pelo governador do estado reeleito, Gladson Cameli, que já foi deputado federal por dois mandatos, além de senador.
3 – A centralidade da agenda ambiental na disputa à capital
Se considerado o Plano de Governo apresentado por Tião Bocalom na eleição municipal de 2020 à prefeitura de Rio Branco, há um diagnóstico socioambiental da cidade de Rio Branco, o qual aponta que o modelo de desenvolvimento urbano implantado em Rio Branco é insustentável nas dimensões econômica, social e ambiental.
No programa do atual prefeito ainda são ressaltados problemas socioambientais condizentes a um “modelo de desenvolvimento irracional, socialmente desigual e ambientalmente degradador, em que predominam a fragmentação das relações espaciais, das identidades coletivas e da desarticulação das relações campo-cidade”. Sobre este aspecto, exemplifica a partir das cheias do rio Acre e os consequentes problemas decorrente das inundações.
Da leitura e análise ao plano de governo de Tião Bocalom, observa-se que houve um espaço de destaque no documento à problemática socioambiental no município, conferindo relevância ao assunto, apesar de não trazer soluções para problemas associados ao desmatamento ilegal, queimadas e mudanças climáticas.
Nestas eleições, por representar os partidos vinculados ao campo da direita no estado, há a possibilidade de o meio ambiente ser esvaziado da pauta de discussões ou de ter espaço reduzido se for adotada a linha da defesa de uma política voltado ao avanço do agronegócio.
Enquanto candidato a vice-governador na chapa com Jorge Viana nas eleições de 2022, o Plano de Governo apresentado à época por Jorge Viana e Marcus Alexandre incluía somar ao esforço mundial contra a crise climática e a retomada de ações de combate ao desmatamento ilegal. Também propunham reformar o sistema de licenciamento do manejo florestal madeireiro, criar incentivos para restaurar e recompor a floresta, bem como combater a grilagem e invasão de terras.
Os debates envolvendo a proposta de governo a ser construída por Marcus Alexandre para a disputa deste ano envolvem um documento centrado em três pilares: um deles associado à manutenção de políticas públicas fundadas em gestões anteriores que se mostraram adequadas, bem como estabelecer novos rumos quando identificadas políticas públicas entendidas como fracassadas. Outro pilar envolve a governança administrativa da gestão com vistas à fluidez no cuidado com as necessidades cotidianas do município. E o terceiro pilar compreende a implementação de tecnologias que otimizem o serviço público.
Considerando o fato de Marcus estar vinculado a um partido de centro, será essencial observar se a agenda ambiental ainda será uma pauta prioritária ou se perderá força, se comparado ao cenário em que esteve na condição de vice de Jorge Viana na disputa ao governo do estado em 2022.
Cabe ressaltar que o meio ambiente não tem sido um elemento central de campanha. Durante o ano de 2022, foram realizadas rodadas de grupos focais nas capitais dos estados da Amazônia Legal buscando identificar as percepções dos cidadãos em relação ao clima, meio ambiente e eleições. Nas respostas, a questão ambiental não apareceu nenhuma vez de maneira espontânea, ainda que, quando provocados, apontaram as mudanças climáticas como um problema concreto.
4 – Cenários possíveis
Até as convenções partidárias é muito provável que venham a existir fatos novos na conjuntura política envolvendo a disputa ao Executivo municipal na capital. A construção de alianças, a definição e/ou confirmação dos vices nas chapas, a possibilidade de novos atores políticos entrarem na disputa, a identificação, por parte do eleitor, de candidatos associados ao lulismo ou ao bolsonarismo são algumas das variáveis importantes a se considerar na disputa eleitoral que se avizinha.
Quando à Tião Bocalom, a consolidação da aliança com o PP é um fator importante, aliado à expansão da adesão de atores políticos e partidos à sua candidatura. Em paralelo, identificar e implementar estratégias visando a transferência do voto bolsonarista mostra-se um elemento central a ser considerado pelo pré-candidato.
A definição de apoio por parte do governador à Bocalom também é um elemento importante no contexto da disputa eleitoral. A cultura política do Acre das últimas eleições tem envolvido a capacidade de mobilizar eleitores a partir do que se entende como carisma, o que exige um processo de recomposição da imagem dos políticos. Vale ressaltar que o governo de Gladson Cameli é considerado bom ou ótimo por 42,3% da população da capital contra 16,7% que consideram a gestão ruim ou péssima. Estes números sugerem que, caso o governador continue a manifestar apoio ao pré-candidato, poderia elevar as chances deste ser eleito, isto caso consiga transferir os votos.
Quanto à Marcus Alexandre, resta saber se o apoio do PT à sua candidatura resultará na transferência de votos e, se no âmbito do MDB, os apoiadores mais à direita do espectro partidário o veem como um candidato que representa a legenda. A oposição ao candidato da centro-esquerda tenderá a fazer uso da estratégia de buscar associar Marcus ao PT no sentido nacionalizar a disputa na capital acreana trazendo a polarização esquerda/direta. Neste processo, a posição dos partidos situados no centro do espectro ideológico podem ser um fator decisivo no resultado da disputa eleitoral.
Para além disso, outros candidatos ainda podem entrar em cena. É o caso de Emerson Jarude, deputado estadual, do Partido Novo, que pode se apresentar como uma terceira via, criando uma narrativa de ser a alternativa para os eleitores que não almejam votar no atual prefeito, Tião Bocalom, nem no ex-prefeito, Marcus Alexandre. Jarude é um parlamentar de uma geração que tem as redes sociais como um elemento importante de relação com os eleitores.
A última pesquisa divulgada apontava o pré-candidato Marcus Alexandre com 45% dos votos, seguindo por Tião Bocalom, com 32% das intenções de voto. Na pesquisa estimulada, Emerson Jarude aparecia com 7% dos votos na disputa envolvendo a capital. Considerando as pesquisas, a candidatura de Jarude, se confirmada, pode ser um elemento central na disputa eleitoral em Rio Branco.
Agradecimentos
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Acre (FAPAC) – Iniciativa Amazônia + 10.