Fragmentação e volatilidade no Sistema Partidário de Roraima (2002-2018).

Roberto Ramos Santos, Geyza Pimentel, Edileuson Almeida eJeferson França Castro

O objetivo deste boletim é apresentar os níveis de fragmentação e volatilidade eleitoral do sistema partidário do estado de Roraima entre 2002 e 2018. Os dados utilizados na pesquisa são das eleições realizadas para a Câmara dos Deputados e para a Assembleia Legislativa. O propósito do trabalho foi identificar, na dinâmica eleitoral, o formato do subsistema partidário e nele observa-se que, no período analisado, houve decréscimo das taxas de fragmentação e volatilidade, servindo para aumentar o grau de institucionalização do sistema político estadual.

Na análise da fragmentação eleitoral, o índice do Número Efetivo de Partidos (NEP), desenvolvido por Laakso e Taagepera (1979), foi utilizado como variável de pesquisa. Este índice mensura o peso relativo dos partidos na competição por voto e na distribuição parlamentar das cadeiras, descartando as siglas que receberam dos eleitores, os menores percentuais de voto e de representação política nas eleições legislativas.

Quanto ao índice de volatilidade eleitoral, elaborado por Morgens Pedersen (1983), procurou-se, pela sua aplicação, medir as alterações na preferência partidária dos eleitores entre duas eleições consecutivas. O cálculo do índice revela o grau de instabilidade dos sistemas partidários, tendo em vista que apresenta dados agregados sobre transferência de votos entre partidos. Quanto maior for essa transferência, menor é a capacidade do sistema partidário de apresentar lealdades políticas estáveis por parte dos eleitores. Tem-se como certo que, níveis altos de volatilidade, acima de 30 pontos, são indícios de pouco enraizamento dos partidos na sociedade. Por seu turno, há tendência de institucionalização de um sistema partidário quando a taxa de volatilidade, ao longo do tempo, caminha para patamares próximos de zero.

Na aplicação do NEP para as eleições legislativas de Roraima, verifica-se, no Gráfico 1, a expansão do multipartidarismo no estado. Tanto os dados da Câmara, quanto os da Assembleia, evidenciam crescimento efetivo de competição eleitoral no período. Na Câmara, o NEP quase triplicou entre a primeira e a última eleição. A série histórica mostra que, em 2002, o sistema partidário estadual registrou a presença de seis partidos efetivos competindo pelo voto da maioria dos eleitores que compareceram às urnas no dia da votação. Já em 2006, o número de partidos efetivos foi de 11. Em 2010, apesar do cálculo do NEP ter mostrado diminuição da fragmentação partidária, ainda assim, o índice de oito partidos efetivos obtido foi maior do que o registrado na eleição de 2002. Em 2014, o NEP da Câmara voltou a subir, configurando a dispersão do eleitorado em 12 partidos efetivos. Em 2018, o contexto eleitoral foi de extrema fragmentação, com 17 legendas disputando as oito vagas de Roraima na Câmara dos Deputados.

Gráfico 1 – Número de Partidos Efetivos, eleições para a Câmara dos Deputados e Assembleia Legislativa, Roraima (2002-2018)
(Fonte: Elaboração própria com base nos dados do TSE)

Na votação para a Assembleia Legislativa, a configuração do NEP incluiu na disputa por voto um número bem mais extremado de legendas, com taxa variando de 16 para 19 partidos no período 2002-2018. A menor taxa encontrada pela pesquisa foi em 2006, com 15 partidos efetivos. A maior foi em 2014 e 2018 com 19 competidores. No cômputo geral, as eleições para a Assembleia Legislativa de Roraima mostraram quadro mais complexo de divisão multipartidária em relação às eleições para a Câmara dos Deputados. Fato justificado pela magnitude da Assembleia ser maior em relação à da Câmara dos Deputados. Magnitude é o número de cadeiras que, nas eleições, serão preenchidas. A Assembleia Legislativa de Roraima tem 24 cadeiras disputadas.

Considerando a evolução do número de partidos parlamentares efetivos, Gráfico 2, o cálculo do índice revela taxa de variação maior para a Câmara dos Deputados. O NEP da Câmara, no período, dobrou de tamanho, subindo de quatro partidos efetivos, em 2002, para oito em 2014 e em 2018. Como a magnitude de Roraima no legislativo federal é de oito cadeiras, ela foi, nas duas últimas eleições, distribuída igualmente por oito partidos relevantes, atingindo a capacidade máxima de fragmentação permitida pela configuração do sistema político estadual. No caso da Assembleia, o NEP, com pouca oscilação no período, subiu de 12 para 13 partidos efetivos entre 2002 e 2018, correspondendo a uma fragmentação de 54,2% do total de cadeiras nas duas últimas eleições.

Gráfico 2 – Número de Partidos Parlamentares Efetivos, Câmara dos Deputados e Assembleia Legislativa, Roraima (2002-2018)
(Fonte: Elaboração própria com base nos dados do TSE)

Quanto ao desempenho dos coeficientes de volatilidade eleitoral, percebe-se no Gráfico 3 que ainda é grande o número de eleitores roraimenses que costumam trocar de preferência partidária no pleito subsequente. O que contribui para manter relativamente baixo o processo de cristalização dos partidos estaduais nas eleições proporcionais.

Gráfico 3 – Índice de volatilidade eleitoral de Roraima para a Câmara dos Deputados e Assembleia Legislativa, 2002-2018
(Fonte: Elaboração própria com base nos dados do TSE)

Na análise do Gráfico 3, observa-se que o índice de volatilidade eleitoral decresceu apenas nas eleições para a Câmara dos Deputados no intervalo 2006-2010. Nesse período, a taxa de variação encontrada foi de 37,3 pontos. Já na competição para a Assembleia Legislativa o índice de volatilidade eleitoral subiu de 26,5 pontos, no par 2002-2006, para 30 pontos no período 2006-2010. Nos demais intervalos, considerando as duas modalidades de competição, os dados mostram aumento de instabilidade na seleção das elites políticas legislativas, principalmente no par eleitoral 2014-2018, quando o valor da volatilidade atingiu 45,2 pontos na disputa para a Câmara dos Deputados e 38,2 pontos na disputa para a Assembleia Legislativa. Com base nos dados do Gráfico 3, pode-se concluir que o sistema político estadual não tem ainda um padrão de estabilidade na preferência dos eleitores, capaz de, nos processos eleitorais, prever, minimamente, qual vai ser a força eleitoral dos partidos em competição.

Entre os fatores que podem explicar a baixa institucionalização do sistema partidário roraimense no período estudado, citamos pelo menos dois aspectos: o primeiro, a migração partidária de políticos entre eleições, e o segundo, a entrada dos novos eleitores no sistema político estadual.

Com relação ao primeiro fator, analisando a disputa partidária eleitoral para a Assembleia Legislativa roraimense, Santos (2022) mostra que 60,7% dos deputados estaduais mudaram de partido no par eleitoral 2010-2014 e 64,7%, no par eleitoral 2014-2018. Foi o caso, por exemplo, do ex-presidente da Casa, Jalser Renier, que, dentre os mais votados, mudou de legenda três vezes nas últimas eleições. O político foi eleito para o cargo de deputado em 2010 pelo DEM; em 2014 pelo PSDC/DC; e em 2018 pelo partido Solidariedade.

No conjunto das eleições, com a desfiliação partidária de Renier, tanto o DEM quanto o PSDC/DC, esvaziaram, na disputa para a Assembleia, suas votações na eleição seguinte: o DEM caiu de 6,9% de votos em 2010 para 0,7% em 2014 e o PSDC/DC declinou sua força eleitoral de 5% para 1,6% entre 2014-2018. As variações negativas do DEM e do PSDC/DC só aumentaram a evidência de que os eleitores do estado não são tão partidarizados, preferindo orientar o voto mais nos políticos do que nos partidos, conforme tem demonstrado a literatura política que trata sobre partidos e eleições no Brasil.

Quanto ao segundo fator, pelos dados do TSE, de 2002 a 2018, o eleitorado roraimense cresceu progressivamente 62,6%. Isso nos leva a acreditar que a entrada de novos eleitores no subsistema político, em curto espaço de tempo – foram apenas 16 anos de eleições –, causou determinado impacto no padrão de competição partidária, tendo efeito na variação das taxas de volatilidade e NEP registradas pelos Gráficos 1, 2 e 3. Temos a opinião de que, em sistemas de pouca institucionalização, como é o caso do sistema político roraimense, quando novos eleitores entram na composição do eleitorado, a maioria não tem ainda nenhuma lealdade política estável, nem a partido nem a candidato, podendo antes variar de preferência eleitoral no sufrágio seguinte.

As eleições proporcionais de 2022 poderão ser um bom termômetro para verificar se as taxas de fragmentação e volatilidade permanecem elevadas no sistema partidário local, ou se os resultados eleitorais indicarão haver alguma mudança de direção, com os partidos obtendo evidências de maior cristalização no sistema político estadual.

Referências

LAAKSO, Markku; TAAGEPERA, Rein. The “effective” number of political parties: a measure with application to West Europa. Comparative Political Studies, v. 12, n. 1, p. 3-27, 1979.

NICOLAU, Jairo Marconi. Notas sobre os quatro índices mais utilizados nos estudos eleitorais. In: LIMA JÚNIOR, Olavo Brasil (org.). O sistema partidário brasileiro: diversidades e tendências, 1982-94. Rio de Janeiro: FGV, 1997.

PEDERSEN, Mogens. Changing patterns of electoral volatility in european party systems, 1948-1977: explorations in explanation. In: DAALDER, H.; MAIR, Peter. Western european party systems: continuity and change. Beverly Hills: Sage, 1983.

SANTOS, Roberto Ramos. Composição partidária e representação parlamentar nas eleições para a Assembleia Legislativa de Roraima, 1990-2018. In: SANTOS, Roberto Ramos; OLIVEIRA, Reginaldo Gomes de. Do passado ao presente: voto e institucionalidade da Assembleia Legislativa de Roraima, 1998-2018. Boa Vista: Editora da UFRR, 2022.